Esta quarta-feira, dia 16 de março de 2022, Manuel Cargaleiro, o mestre do Abstracionismo Lírico português festeja o seu 95º aniversário. O artista português Manuel Cargaleiro criou uma linguagem marcante no mundo artístico pela combinação da cerâmica e da pintura, através de jogos entre cor, luz e sombra. As suas obras são fortemente caracterizadas pelo recurso à geometria e à linguagem abstrata, tendencialmente não-figurativa com pinceladas espontâneas e dinâmicas repletas de cores vibrantes, que se sobrepõem-se à forma, reduzindo a formalidade que caracteriza os elementos geométricos. A exploração da cor é uma das principais características da sua obra, por revelar sentimentos e criar diversos espaços numa só composição. Denota-se a influência do azulejo tradicional português, pela repetição dos quadriláteros e o uso de cores como azul e branco. Além da pintura e cerâmica, Manuel Cargaleiro também explorou o desenho, a escultura, a tapeçaria e a gravura. Descubra mais sobre Manuel Cargaleiro neste artigo.
1.Começou pela cerâmica
Começou a brincar com a cerâmica quando ainda andava na escola primária, na casa de um oleiro, José Trindade. Mais tarde descobriu a pintura, quando foi para a Escola de Belas Artes. «Sempre senti essa necessidade de fazer pintura.» — Manuel Cargaleiro
2.Antes das Belas Artes, estudou Ciências.
Manuel Cargaleiro afirmou: «O meu pai era agricultor, e o sonho dele era que eu fosse veterinário, ou engenheiro agrónomo. O meu irmão foi veterinário, mas eu é que não fui agrónomo.»
3.Enquanto estudante nas Belas Artes, foi professor na Escola António Arroio.
Manuel Cargaleiro conta: No segundo ano, realizou uma exposição só de cerâmicas na Galeria de Março, com o José-Augusto França. Como na altura tinha-se reformado um professor de pintura e cerâmica na António Arroio, eles levaram lá o ministro da Educação, que era o Francisco Leite Pinto, e ele disse “chamem este”. Disse-lhes que ainda não tinha acabado o curso. “Não faz mal; vai ser nomeado por despacho ministerial” (risos). Estive na António Arroio uma série de anos. Aconteceram várias coisas, e a certa altura tomei a decisão: “A minha vida não é ser professor, e vou arriscar, vou deixar o ensino”.
4.Viveu na Rue des Grands Augustins, onde morava o Picasso.
Eram praticamente vizinhos, Pablo Picasso morava no nº 7, e Manuel Cargaleiro no 19. Estiveram ao lado um do outro mas nunca formaram uma amizade. Manuel Cargaleiro contou: «Eu fui amissíssimo do Max Ernst, do Jan Earp, da Camille Bryen, da Natalie Gontcharova, esses pintores surrealistas e grandes artistas, que estavam na mesma galeria Edouard Loeb que eu. Agora, com o Picasso, não. Estive várias vezes ao lado dele, fui a inaugurações de exposições suas. Mas nunca quis… Acho que o Picasso ultrapassa tudo. Ele estava sempre a trabalhar, e eu era incapaz de o importunar.»
5.Foi amigo de Vieira da Silva e Árpád Szenes e integrou a Escola de Paris dos anos 50
Foi para Itália com uma bolsa do estado italiano e, posteriormente, para França com uma bolsa da Gulbenkian, para ficar a trabalhar na fábrica de cerâmica Faiencerie de Gien. Este local e a própria capital francesa deram-lhe oportunidade únicas, numa altura em que Portugal estava fechado pela ditadura de Salazar. Paris foi o centro da cultura e arte durante o século XIX e XX, assim muitos artistas de nacionalidades distintas juntaram-se e partilharam ideias, sendo relembrados pela denominação de escola de Paris. Os portugueses, Manuel Cargaleiro e Vieira da Silva, foram dos últimos artistas que integraram esta conhecida escola de Paris e também a última geração do movimento abstracionismo lírico.
6.Definiu-se como um “abstraccionista lírico”
Segundo o artista português o abstraccionismo lírico é uma definição simplista, de um grafismo que transmite o estado de alma da pessoa num dado momento. Não é uma coisa abstracta, é uma situação real. Quando pinta e desenha, representa uma sensação, e tenta transmiti-la.
«As pessoas, quando olham para aquilo, não podem vê-lo simplesmente como um elemento decorativo: “Ai é muito bonito, muito decorativo!”. Isso é pouco. Um operário que está na fábrica e repete o mesmo desenho milhares de vezes, isso sim é abstraccionismo. Aliás, o Paul Klee tem num dos livros dele uma frase que acho muito interessante: “Há linhas de tristeza, linhas de alegria, linhas de felicidade…”. Quer dizer, as sensações podem-se transmitir por linhas.» — Manuel Cargaleiro
7.Uma referência da arte portuguesa desde meados do século XX
Pintor e ceramista, Manuel Cargaleiro (Vila Velha de Ródão, 1927) é uma referência da arte portuguesa desde meados do século XX até à actualidade. É um dos últimos pintores que integrou a conhecida escola de Paris e o movimento abstracionismo lírico. As suas obras encontram-se em vários locais do mundo, tendo em Portugal uma obra pública na estação do colégio militar mas também em Paris. Em Itália alimentou uma ligação especial à cidade italiana de Vietri Sul Mare, atualmente sede da Fondazione Museo Artistico Industriale Manuel Cargaleiro.